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Articulações, cosmovisões e educação escolar indígena na pandemia

Historicamente violentados pela propagação de doenças infecciosas importadas, os povos indígenas do Brasil vêm experimentando condições bastante difíceis de combate ao avanço da pandemia da COVID-19 em suas comunidades. Diversas etnias de todas as regiões do país têm se organizado para fornecer respostas efetivas ao avanço da doença e às ações do Estado burguês e colonial, que instrumentaliza surtos patológicos de alto impacto para fazer avançar a agenda política das elites locais, nacionais e internacionais, numa ação dupla de negligência e ataque.

        Para responder ao avanço duplo da corona virose e dos ataques aos direitos indígenas  variados povos e entidades parceiras vêm se articulando em torno de associações indígenas e indigenistas, locais e nacionais, como a APIB e a APOINME, e de redes diversas, como a REMDIPE, em Pernambuco,  visando a elaboração de estudos diagnósticos e a promoção de campanhas de doações de equipamentos para as equipes de saúde e de alimentos.

        Além disso, iniciativas autônomas no campo da comunicação vêm crescendo entre diversos povos do país. Merece destaque, por exemplo, a realização no formato on-line da tradicional Assembleia do Povo Xukuru do Ororubá (PE), que costuma reunir anualmente milhares de indígenas e não indígenas em um encontro de três dias e em um ato em memória do Cacique Xicão Xukuru. A exemplo da Ororubá Filmes, coletivo de comunicação do povo Xukuru, vários grupos indígenas têm se articulado na produção de uma comunicação autônoma e independente.

        As medidas de combate à pandemia da COVID-19 vêm, ademais, suscitando reflexões acerca de seus impactos sobre as diferentes formas de organização social e sobre os diversos modos de vida dos povos indígenas. As medidas de distanciamento social vem, assim, alterando profundamente o cotidiano das comunidades tradicionais, como conta Socorro Kapinawá, liderança indígena e sócia-fundadora do Instituto Candeeiro: “somos acostumados a vivermos juntos. Sentimos falta dos nossos torés, dos movimentos, de irmos em outras aldeias, outros povos…”. Como pensar, assim, noções de distanciamento quando as bases da organização social não são necessariamente a do núcleo familiar estrito e quando a existência de bens comuns, coletivos e compartilhados é beneficiada em detrimento da ideia de propriedade privada?

        Num momento em que a normalidade sistêmica do capitalismo contemporâneo é conturbada  por um agente biológico inesperado, afetando sobremaneira a vida humana, somos todas/os instadas/os, individual e coletivamente, a repensar os fundamentos da forma hegemônica de relacionamento com a natureza. Os diferentes modos de vida indígenas, assim, apontam variados caminhos para se superar a lógica da financeirização da natureza e do esgotamento de recursos naturais e se experimentar transições ecológicas nas quais a natureza seja também um sujeito do desenvolvimento, da educação e da cultura.

A educação escolar indígena em tempos de distanciamento social

        A educação escolar indígena, específica e diferenciada, assegurada por direito, também teve seu cotidiano bastante alterado. Socorro Kapinawá, professora da educação indígena de seu povo por mais de 30 anos, conta, por exemplo, que no estado de Pernambuco as atividades letivas das escolas indígenas foram suspensas por meio de decreto estadual que abrange toda a rede de educação. Sem o habitual movimento das/os estudantes (que realizam atividades remotamente através do celular), as escolas recebem apenas periodicamente a visita da equipe gestora e de serviços para manutenções estruturais e trabalhos administrativos. O Projeto Plantio de Pífanos, por exemplo, uma iniciativa de professores e professoras da Escola Estadual Indígena Saturnino Vieira, na T.I. Kapinawá e o Instituto Candeeiro, teve suas atividades interrompidas diante da suspensão das atividades escolares na Rede Pública de Educação de Pernambuco.

        O distanciamento social, portanto, suscita variadas reflexões acerca da educação escolar indígena específica e diferenciada no contexto pandêmico. Sendo a educação, ao lado pelo direito ao território, uma das lutas mais densamente travadas pelos povos indígenas, podemos nos perguntar: como continuar as atividades educativas coerentemente aos modos de vida tradicionais uma vez que as práticas culturais indígenas foram sensivelmente alteradas nesse momento? De quais ferramentas podemos lançar mão no monitoramento dos direitos indígenas à educação durante o distanciamento social frente às ações dos órgãos públicos indigenistas? É possível a continuidade de uma educação escolar comunitária e intercultural a distância?

Participe de campanhas indígenas e indigenistas

Segue abaixo endereços de sítios de organizações e redes indígenas e indigenistas que fornecem atualizações regulares da situação de comunidades indígenas no contexto da pandemia da COVID-19 e que articulam campanhas de doações e de mobilizações pelos direitos dos povos originários.

 

 

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